MPF lança exposição de fotos que retrata vida de indígenas recém-saídos do isolamento no Amazonas

Registradas pelo fotógrafo Sebastião Salgado, imagens mostram a cultura e o estilo de vida do povo korubo, do Vale do Javari.

A manutenção da política de não contato com indígenas em situação de isolamento voluntário é medida que se impõe para a própria sobrevivência desses povos. Esse foi o tom trazido pela coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF), subprocuradora-geral da República Eliana Torelly, à cerimônia de lançamento da exposição Índios Korubo – Vale do Javari, nessa sexta-feira (5). Os indígenas de recente contato tornaram-se personagens de uma coletânea de 15 fotografias de autoria de Sebastião Salgado. A exposição será aberta ao público a partir da próxima segunda-feira (8), no Memorial MPF, localizado na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília.

Além da coordenadora da 6CCR, a cerimônia de lançamento contou com a presença do vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, da procuradora da República Aline Martinez dos Santos, que atua em Tabatinga (AM), área que compreende o Vale do Javari; da liderança Beto Marubo, representante da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari; e da antropóloga Juliana Oliveira Silva, primeira pesquisadora a residir com os korubo. O fotógrafo Sebastião Salgado participou por videoconferência.

Marubo contou que foi um dos primeiros a ter contato com os parentes em isolamento, ameaçados física e culturalmente pela presença de caçadores, contrabandistas, traficantes, garimpeiros e missionários religiosos. Alertou que essas populações estão em risco permanente e defendeu a importância da Funai reconhecer a necessidade de criar e manter políticas públicas diferenciadas para a proteção dos povos de recente contato, bem como daqueles que desejam permanecer em isolamento.

O líder indígena afirmou ainda que, quando foi procurado por Salgado para ser o elo com os korubo, viu no projeto a oportunidade de chamar atenção da sociedade para a situação dos povos isolados. A intenção das fotografias, segundo ele, é atingir a sensibilidade do espectador, mostrando a importância da vida dos korubo e sua forma cultural de maneira didática. “Hoje, os korubo estão passando fome porque o território deles está desprotegido. Daí a importância da política pública do não contato, da proteção dos isolados e de um órgão indigenista brasileiro que proteja os índios”, ponderou.

A antropóloga Juliana Oliveira Silva conviveu com os korubo entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2020. Ela relatou que, habitualmente, invasores ingressavam na região para obter carne de caça ilegal e comercializá-la na região. “Ouvi, diversas vezes, disparos de espingardas dos invasores caçando nas proximidades das aldeias”, disse. Segundo ela, essas invasões ameaçam diretamente a segurança física e alimentar dos korubo de recente contato e dos demais povos da terra indígena, inclusive daqueles em situação de isolamento voluntário.

A procuradora da República Aline Martinez lembrou que apenas parte dos korubo se abriu para o convívio com não-indígenas, enquanto muitos ainda permanecem em situação de isolamento. Para ela, é dever do MPF atuar para que essas populações tenham assegurado o direito de manter sua essência e raízes intactos. “Em um mundo multiétnico e multicultural, cabe a cada um de nós respeitar e compreender o direito de ser diferente, de manter seus costumes, suas tradições. É dever do MPF assegurar que esses direitos sejam respeitados”, enfatizou.

Respeito

As imagens de Sebastião Salgado revelam o povo indígena em situações do dia a dia e posando no estúdio montado no meio da Floresta Amazônica, com suas vestimentas, adornos, armas e ferramentas tradicionais. O autor dos cliques participou da solenidade de lançamento da exposição por videoconferência e enalteceu a iniciativa do MPF “de abrigar as fotos no seio da PGR”. Salgado afirmou que, diante da omissão do Estado em proteger os povos indígenas, cabe ao Ministério Público e ao Poder Judiciário “ajudar e compreender a necessidade de tutela das comunidades e do bioma amazônico”.

Para a coordenadora da 6CCR, Eliana Torelly, o olhar sensível do fotógrafo para capturar a história e a essência do povo korubo retrata também o peso de uma causa que vem sendo debatida e defendida com afinco pelo Ministério Público. “A obra de Sebastião poderia falar só por si, mas foi necessário ir um pouco além e entender o dever que nós, como sociedade, temos de proteger essas populações que estão extremamente ameaçadas tanto do ponto de vista cultural quanto físico”, apontou.

O vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, afirmou que a verdade trazida pelas imagens de Sebastião Salgado tem o poder de fazer a reconexão com o sagrado e também com os defeitos que a sociedade não quer enxergar. Ele reiterou o compromisso do MPF com a defesa dos povos originários e disse que, ao trazer a exposição de fotos para o Memorial MPF, a instituição “celebra novamente todos os pactos fundantes da relação com os povos indígenas”.

Isolamento

De acordo com a Funai, há 114 registros de povos indígenas em situação de isolamento no Brasil e 20 considerados de recente contato. O Vale do Javari é ocupado por seis povos em contato permanente e dois povos de recente contato, além de ter 13 registros de povos em isolamento voluntário. No caso dos korubo, há atualmente cerca de uma centena de indígenas em contato, nas aldeias que ficam no baixo Rio Ituí. Outros subgrupos korubo, em população de tamanho ignorado, permanecem em isolamento voluntário, principalmente na fração oriental de seu território, onde sofrem os efeitos da invasão promovida por garimpeiros nos rios Jutaí e Jandiatuba.

Fonte: Ministério Público Federal

Post Author: Victória Rosas

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