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Entrevista com Edison Iunes Ferreira, Economista e Presidente da Cooperativa de Lãs Mauá Ltda, sobre a crise da lã de ovelhas

Muitas pessoas me perguntam sobre a crise da lã, em sua quase totalidade, chegam perguntas carregadas de uma situação de conformismo. Quando nos queixamos de alguma situação de saúde que nos causa mal-estar, às vezes optamos por ouvir opinião do amigo, do vizinho, aceitamos a sugestão de tomar um chá e até de efetuarmos o uso de algum medicamento. E assim conduzimos as nossas dores, aos poucos ela vai se incorporando ao nosso cotidiano, na esperança de que um dia cesse. 

A lã é uma fibra que comercialmente entrou em crise e se assemelha ao caso acima, até o momento vivemos da teoria do “achometro”, mas em nenhum momento foram buscadas as verdadeiras razões que levaram o produto nobre a essa condição. Quem faria isso? Quem lidera esse setor? Existe algum diagnóstico do problema? Nessas perguntas não está a solução, mas seguramente elas nos levam a entender esses quase 4 anos de crise. 

Quando nos propomos a analisar as formas de comercialização da lã, lã suja, lã lavada ou a lã em top, as luzes começam a se acender. Um quilo de lã em top da raça Ideal está sendo adquirido ao custo de R$ 84,00 o quilo, comercializado a R$ 114,00 pelos estabelecimentos comerciais, se analisarmos qual o custo para produzir um quilo de lã em top da raça Ideal, precisamos de 2 quilos de lã Ideal e teremos o custo de R$ 12,00 por quilo de lã suja, além dos fretes até a lavadora, ou seja, R$ 24,00, adicionado o frete de R$ 1,00 em quilo. 

                                                                                                                                                                          

 

Na lã Corriedale, o custo de preparo do “top” está em R$ 11,40 o quilo de lã suja, adicionado o frete de R$ 1,00 por quilo chegamos ao valor de R$ 23,80 e o custo atual do top está em R$ 52,00 o quilo, ou seja, 2 quilos de lã Corriedale repartiriam os restantes R$ 28,20 o que daria uma agregação de valor bruto de R$ 14,10 por quilo de lã suja. Os valores acima são a realidade de mercado do Brasil, mas onde está o problema? O que precisamos entender é que o produtor produz a lã suja, as cooperativas recebiam essa lã e executavam a triagem, a classificação, a lavagem, a cardagem e a penteagem e produziam o top de lã, faziam toda a agregação de valor, se apropriavam de seus custos e retornavam para o produtor o valor restante, portanto o fim desse processo significou o final da parcela mais expressiva de remuneração do valor da lã. A quebra de 22 das 25 cooperativas da década de 90, sendo que todas que faziam a lavagem, cardagem e a penteagem estão entre as 22, é o pivô da crise da lã brasileira”, o resto são consequências: 

 

 

– Primeira consequência – Abandonamos o mercado interno da lã, numa economia que é a sétima maior mercado consumidor do mundo, tem o sexto maior parque têxtil, processa mais de 700 mil toneladas/ano de fibras para o qual chegamos a comercializar 85% da lã produzida, quase a integralidade, produzimos cerca de 7 mil toneladas de lã, ou seja, 1% das fibras, que o país consome, número que se assemelha a média mundial; 

 

 

– Segunda consequência – Na ausência de opção, voltamos a comercializar a “lã suja”, utilizando a intermediação do Uruguai, retrocedemos ao período anterior a 1944, quando assim procedíamos, a criação das cooperativas a partir de 1944 se deu em razão dessa incapacidade até então de agregar valor a lã. Se no momento crítico a alternativa foi voltar a vender a lã suja ao Uruguai, ela deveria ter caráter temporário, até alcançar a solução, o que faltou? Visão? Liderança? Dirão alguns, pouco importa? Pois importa e muito, pois continuamos vendados para o problema e com consequências muito mais amargas ainda, pois o longo período decorrido trouxe perdas culturais expressivas para a cadeia da lã, a mais importante delas é que as pessoas que deveriam vender nossos produtos nas lojas, nem sequer mais conhecem lã, são os vendedores das lojas, basta fazer um teste, chegue há um estabelecimento comercial e solicite uma “blusa de lã” e receberá uma blusa de algodão com sintético, não aconselho discordar da balconista, pois ela irá afirmar que “isso é lã”, culpá-los? Não, lá se vão 30 anos, muitos sequer eram nascidos quando abandonamos o mercado interno. E por onde deve ser o recomeço desse processo? Os primeiros passos começam a ser dados, com a abertura prevista de uma lavadora e a disposição de outra de prestar serviços a terceiros, ou seja, estamos recuperando as condições, a etapa seguinte é: como recuperar o mercado interno da lã? Até agora quem cuidou da cadeia da lã foi a “Natureza”, a partir de agora é preciso que as lideranças do setor ressurjam e assumam esse papel, sem isso, esse caminho ainda será longo, pois só existe uma solução: investimento em marketing. 

 

 

 

 

Escritora

Márcia Ximenes Nunes Chaiben

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