O folclore é a junção de lendas, contos, mitos e histórias sobre criaturas e seres fantásticos que habitam o imaginário de povos tradicionais, baseado na mistura de tradições típicas das várias culturas que formam uma identidade, como a portuguesa, indígena e africana.
Além das histórias, o folclore também é composto por festas, brincadeiras, crenças, comidas típicas e outros costumes que eram transmitidos de geração para geração, como no caso do Rio Grande do Sul, a dança gaúcha.
Neste artigo iremos mostrar uma das famosas lendas gaúchas, escrita por João Simões Lopes Neto.
O Negrinho do Pastoreio
No tempo em que as fazendas tinham escravos, que fizeram as taipas de pedra que a gente ainda vê no campo, havia um estancieiro muito, mas muito mau. Ele só dava valor para a sua prataria e para a sua tropilha de cavalos. E tinha um chamego especial por um baio, que era seu animal de confiança para as carreiras.
Fora isso, não dava pousada para viajante, não emprestava cavalo a ninguém, não dava uma cuia de água. E era dono de um negrinho, que ele chamava de Negrinho, porque nem nome de batismo tinha dado para o infeliz. O guri era obrigado a fazer todas as vontades do patrão, desde aviar o mate até acender o pito dele com um tição. E aguentar muito puxão de orelhas.
Um dia, esse estancieiro atou carreira com um vizinho. Confiava tanto no baio que apostou mil onças de ouro, uma fortuna. E botou o Negrinho de ginete, porque o menino era bom na rédea. Mas o baio perdeu, e lá se foram as mil onças de ouro. O estancieiro chegou em casa e mandou amarrar o Negrinho num palanque e dar nele uma surra de relho. Depois botou o Negrinho, de noite, a cuidar da tropilha dos trinta tordilhos negros e do baio amarrado numa estaca.
O coitado do Negrinho pegou no sono, e quando acordou tinham sumido os tordilhos e o baio. Contam que foi o filho do estancieiro quem espantou os animais. Mas o estancieiro não quis saber de conversa. Mandou amarrar de novo o Negrinho no palanque e dar-lhe uma surra de relho, até que ele parasse de chorar. O menino só gritava pela madrinha Nossa Senhora, até que parou mesmo de chorar.
Deram o Negrinho por morto. O estancieiro mandou jogar o corpo num formigueiro, para as formigas terminarem o serviço, como ele disse. Quando amanheceu o dia, foram ver o formigueiro, e nada do Negrinho. A tropilha e o baio tinham sumido também. O estancieiro mandou a peonada bater o campo léguas e léguas, e nem rastro dos cavalos.
Voltaram para casa e viram o Negrinho de pé no formigueiro, sacudindo as formigas, e o baio do lado dele, mais os trinta tordilhos. E assim como ele apareceu também sumiu de novo com o baio e a tropilha.
Dizem que até hoje ele vive troteando campo afora, montado no baio e tropeando os tordilhos. E se alguém perde alguma coisa é só acender uma vela para o Negrinho e rezar para a sua madrinha Nossa Senhora, repetindo: “Foi por aí que perdi, foi por aí que perdi, foi por aí que perdi”. Se o Negrinho não achar, ninguém mais acha.
Essa história é contada por Simões Lopes Neto em Lendas do Sul e por Clarice Lispector em Como Nascem as Estrelas. Não bem com estas palavras.
A lenda foi retirada do Projeto 7 Lendas Gaúchas, do Clic RBS.