Boitatá é um termo tupi-guarani que é usado para designar o fenômeno do fogo-fátuo, em todo o país. De acordo com a ciência moderna, o fogo-fátuo é causado pela oxidação de fosfina, difosfano e metano, junto a ionização de suas moléculas, formando o plasma, sendo assim, esses compostos, produzidos pela decomposição orgânica, podem causar emissões de fótons, causando o fenômeno.
Neste artigo conheceremos a lenda gaúcha do Boitatá:
Em tempos idos, sobre os quais as gentes não guardam mais lembranças, houve uma noite comprida e escura como breu que foi tomada por um grande dilúvio. Os campos foram inundados, as lagoas subiram e se alargaram e todo aquele peso d’água correu para as sangas e das sangas para os arroios que ficaram bufando campo afora, afogando as canhadas, batendo no lombo das coxilhas. Poucos bichos escaparam, quase tudo morreu. Terneiros e pumas, tourada e potrilhos, perdizes e guaraxains, tudo… Mas a cobra-grande, chamada pelos índios de Guaçu-boi, escapou. Tinha se enroscado no galho mais alto da mais alta árvore e lá ficou até que a enchente deu de si e as águas começaram a baixar e tudo foi serenando.
Vendo aquele mundo de bichos mortos, a Guaçu-boi, louca de fome, achou o que comer. Mas – coisa estranha! – só comia os olhos dos mortos.
Como a Guaçu-boi não tinha pêlos como o boi, nem escamas como o dourado, nem penas como o avestruz, nem casca como o tatu, nem couro grosso como a anta, o seu corpo foi ficando todo transparente, clareando pelos milhares de luzezinhas, dos tantos olhos que foram sendo esmagados dentro dele, deixando cada qual sua pequena réstia de luz. A Guaçu-boi toda já era uma luzerna, um clarão sem chamas, já era um fogaréu azulado, de luz amarela e triste e fria, saída dos olhos, que fora guardada neles, quando ainda estavam vivos.
E tantos olhos comeu e tanta luz guardou, que um dia a Guaçu-boi arrebentou e morreu, espalhando esse clarão gelado por todos os rincões. Os índios, quando viam aquilo, assustavam-se, não mais reconhecendo a Guaçu-boi
Diziam, cheios de medo: “Mboi-tatá! Mboi-tatá!”, que lá na língua deles queria dizer: Cobra de Fogo! Passado um tempo, Boitatá morreu de pura fraqueza, porque os olhos comidos encheram-lhe o corpo, mas não lhe deram substância, pois que sustância não tem a luz que os olhos em si entranhada tiveram quando vivos… E foi então, que a luz que estava presa se desatou por aí. E até pareceu cousa mandada: o sol apareceu de novo! Quem encontra Boitatá pode até ficar cego… Quando alguém topa com ela só tem dois meios de se livrar: ficar parado de olhos fechados e sem respirar, até ir-se ela embora, ou, se anda a cavalo, desenrodilhar o laço, fazer uma armada grande e atirar-lha por cima, e tocar a galope, trazendo o laço de arrasto, todo solto, até a ilhapa! Boitatá vem acompanhando o ferro da argola… Mas de repente, batendo numa macega, toda se desmancha, e vai esfarinhando a luz, para emulitar-se de novo, com vagar, na aragem que ajuda… Tenho visto!
Esta é uma adaptação da lenda de Mboitatá publicada por Simões Lopes Neto, 1913, em Lendas do Sul, e retirada do projeto 7 lendas do sul, do clic RBS.