Desde a era do bronze, há 5.000 anos os animais são as fontes de proteínas de alta qualidade e vários nutrientes essenciais para os humanos. Atualmente os animais são o alicerce da segurança alimentar para a sociedade atual e também meio de subsistência de milhões de pessoas em todos continentes.
Os alimentos de origem animal além de proteínas fornecem uma série de nutrientes altamente biodisponíveis que são essenciais para os humanos. Entretanto estamos vivenciando a entrada no mercado de alimentos que são produzidos com ingredientes exclusivamente vegetais e imitam os alimentos de origem animal e são identificados nos rótulos com o nome dos alimentos de origem animal. Eles estão sendo apresentados como melhor opção para a alimentação da humanidade por supostamente terem menor impacto ambiental na sua produção e serem igualmente nutritivos para as pessoas. Não vamos analisar neste momento o impacto do gado no ambiente, que sabemos varia muito de acordo com a maneira que os animais são criados. Aqui agora vamos nos concentrar na qualidade dos alimentos produzidos e na maneira como serão apresentados e oferecidos para os consumidores no nosso país.
Composição dos Alimentos
A carne fornece proteínas de alta qualidade e vários nutrientes, alguns dos quais nem sempre são facilmente obtidos com dietas isentas de carne. A remoção da carne traz implicações para um amplo espectro de nutrientes que precisam ser considerados. Ela fornece a maior parte da ingestão global de vitamina B12 e desempenha um papel substancial no fornecimento de outras vitaminas B, retinol, ômega de cadeia longa -3 ácidos graxos, vários minerais em formas biodisponíveis (por exemplo, ferro e zinco) e uma variedade de compostos bioativos com potencial para melhorar a saúde (por exemplo, taurina, creatina e carnosina) (Animal Frontiers, 2023 ).
Entretanto os alimentos de base vegetal estão sendo apresentados como uma melhor opção e ainda, sendo comercializados com o nome dos alimentos de origem animal. O objetivo de usar o nome dos alimentos de origem animal (carne, leite, ovos, mel, pescados) e seus derivados em alimentos que não são provenientes de animais é levar os consumidores a pensar que o alimento é de igual qualidade para a sua alimentação e de sua família. Mas isto não é verdade, visto que eles não possuem o mesmo valor nutricional. A simples denominação do produto como análogo ao de origem animal fere o direito de informação do consumidor e dá margem a confusão e falsas interpretações.
Vejamos mais detalhes. Por definição, análogo significa: conforme, equivalente, similar, semelhante, correspondente, congênere. Mas isto não ocorre quando analisamos e comparamos alimentos proveniente de animais e os a base de plantas. Eles são muito diferentes:
- Eles não têm a mesma origem. Reino vegetal e reino animal são bastante diferenciados. Animais e vegetais diferem completamente nas suas estruturações, complexidade, metabolismo, nutrição, reprodução e ciclos de vida. E isto impacta nas suas constituições e consequentemente nos nutrientes que podem proporcionar aos consumidores. Não são correspondentes, congêneres e muito menos equivalentes.
- Eles não têm o mesmo valor nutricional. Conforme publicação na revista científica Nature (2021), a composição e perfil metabólico entre a carne bovina e os de base vegetal diferem em 90% pois somente 19 dos 190 compostos que foram analisados são comuns. Portanto, do ponto de vista nutricional não se pode dizer que são semelhantes e que podem ser intercambiáveis sem perdas para os consumidores.
- Alimentos de base vegetal possuem inúmeros aditivos químicos. Eles são processados e contém necessariamente aditivos indesejáveis para os consumidores, para que tenham aparência, textura, cor, aroma e sabor os alimentos de origem animal.
Pelos motivos relatados, a Comunidade Europeia e vários outros países tem estabelecido normas para identificar corretamente estes produtos e vêm proibindo usar nomes de alimentos de origem animal em alimentos de base vegetal e de outras origens. Seguem:
Comunidade Europeia – 2013 – restringiu o uso do nome: leite, manteiga, nata, iogurte, queijo, somente para derivados do leite da glândula mamária.
França – 2018 – proibiu chamar de bife, filé, bacon, linguiça, os produtos origem vegetal.
Uruguai – 2020 – proibiu chamar de carne e derivados produtos que são feitos total ou parcial com ingredientes vegetais.
Texas/EUA – 2021 – proibiu chamar de carne e derivados produtos de base vegetal, cultura de insetos e cultivos celulares.
Argentina – 2023 – O tema está em discussão. A Sociedade Rural Argentina argumenta que usar o termo carne para outro produto que o imita é falso e confunde o consumidor.
No Brasil, está em consulta pública.
Aqui no Brasil, apesar de já existirem no mercado várias startups atuando neste novo mercado e gigantes do setor de alimentos já lançando seus produtos, existe um vazio regulatório dos órgãos de controle dos alimentos. Por isso, já vemos a comercialização de produtos com utilização indevida da terminologia “carne” e “leite” para identificar produtos que não são de origem animal. Alguns projetos de Lei estão em discussão e inclusive agora está em consulta pública uma regulamentação sobre permitir rotular e comercializar os alimentos de base vegetal com o nome dos alimentos de origem animal, identificados como análogo a estes, o que com certeza causará uma falsa impressão aos consumidores que eles são equivalentes.
Claro que as empresas são livres para produzir alimentos de base vegetal e as pessoas também são livres para escolher o que desejam comer, mas usar nos seus rótulos nome dos alimentos de origem animal engana os consumidores. Além disto, causa estranheza, pois os alimentos de base vegetal surgem justamente para substituir a carne, de demais alimentos de origem animal, mas depois querem seguir chamando de carne?
A regulamentação está em consulta pública até 15/setembro/2023 e todos que quiserem podem e devem se manifestar.
— Acessar o SISMAN. Primeiro, a pessoa deve se cadastrar e depois responder à consulta.
Quanto mais pessoas participarem, melhor.
A autora é Médica-Veterinária, Diretora do Instituto do Bem-Estar (IBEM) e Coordenadora da Comissão de Pecuária Orgânica do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio Grande
do Sul.