“Eu sempre quis ser pai”, conta o agente de portaria Marcelo Pereira, 42, que participou do mutirão da campanha “Eu tenho Pai”, da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM), neste sábado (23), em Manaus. A ação realizou aproximadamente 500 atendimentos, na sede da DPE-AM, no bairro Aleixo, entre testagem de DNA e outros serviços envolvendo parentalidade.
Marcelo chegou ao local com Maria Alice, 9, bastante emocionado, para fazer o reconhecimento voluntário da paternidade da menina, que vive com ele desde pequena, e também um exame de DNA para tirar a dúvida se criança é sua filha biológica ou não.
O agente de portaria explicou que fazer o reconhecimento paterno é importante para questões do práticas do dia a dia, dando a ele legitimidade para resolver assuntos escolares e médicos da filha, por exemplo, responsabilidades que hoje competem apenas à mãe da criança, com quem Marcelo foi casado por 10 anos.
“Nos separamos e outro homem acabou registrando a Maria. Mas, só registrou. O pai sempre fui eu. Então, depois de ver na televisão que ia ter esse mutirão aqui na Defensoria, nós viemos para fazer o registro documental da paternidade afetiva, para não ficar incomodando toda vez a mãe dela, que trabalha muito, e também fazer o exame de DNA. Mas, independentemente do resultado, dando positivo ou negativo, não importa. Viemos mais para registrar em meu nome, porque o meu amor ela já tem. Ela já até assina meu sobrenome”, disse, emocionado.
A pequena Maria Alice disse que ficará muito feliz quanto tirar a Carteira de Identidade Nacional (CIN) com o nome do pai. Ela também estava bastante emocionada durante o atendimento.
Paternidade responsável
Marcelo Pereira enfatizou que, para ele, paternidade é mais que o mero registro oficial. “Às vezes, o nome só está lá para enfeite. A maioria registra e cai fora. Mas, eu não. Eu sempre quis ser pai. Meu sonho era ter duas meninas e eu realizei. Tenho a Maria Alice, minha caçula, e a irmã mais velha dela”.
O agente de portaria ressaltou que o pai registrar os filhos é fundamental para o desenvolvimento pleno da pessoa. “Sei disso porque eu passei por isso. O meu não me registrou até hoje. Fez falta. Têm coisas que só o pai pode fazer. Têm coisas que só a mãe pode fazer”.
“Eu tenho feito meu papel, mas agora eu quero deixar no documento para minha filha poder olhar e dizer ‘eu tenho sobrenome do meu pai’. Eu já vou nas reuniões da escola, faço as tarefa de casa, com ela para o cinema sempre que podemos. Só falta oficializar no documento”, reforçou.
A paternidade participativa e responsável é um dos motes da campanha deste ano, conforme explicou o Defensor Público Geral do Amazonas, Rafael Barbosa.
“Esta é a quarta edição da campanha, que neste ano tem um foco um pouco diferente das edições anteriores, que é na paternidade responsável. A ideia é mostrar não só a importância de se ter o nome do pai no registro, mas, acima de tudo, que essa paternidade seja responsável, que esse pai possa efetivamente contribuir para a construção do caráter e da personalidade madura dessa criança”, observou.
Coordenadora da área de família da DPE-AM, a defensora pública Sarah Lobo destacou os números de crianças sem o registro do pai no ano passado: de 2,5 milhões de nascidos, mais de 172 mil não têm pai registrado na Certidão de Nascimento.
“É um número muito grande e o Amazonas ocupa o quinto lugar no ranking nacional. Cerca de 9,08% das crianças ano passado registradas mas não têm pai registrado”, informou.
DNA, registro voluntário e outros serviços
A defensora pública detalhou os serviços oferecidos no mutirão deste sábado na capital. “Atendemos ações que envolvem parentalidade, como exames de DNA, ações de guarda, alimentos, revisional de alimentos, então tudo que envolve a parentalidade hoje foi a nossa prioridade”, disse Sarah Lobo.
O casal Poliana Melo, 29, e Paulo Sérgio, 33, ouviu no rádio que haveria o mutirão da campanha e agendou a realização do exame de DNA. Moradores do bairro Cidade de Deus, eles buscam tirar a dúvida sobre a paternidade biológica do filho. “Eu liguei e agendei para ser atendido às 8h30. Chegando aqui, foi tudo rápido”, contou o motorista de transporte por aplicativo.
“Se fôssemos fazer o exame particular, com certeza ia ser demorado e caro”, acrescentou a dona de casa.
“Eu gostei bastante. Disseram que o resultado sai no dia 23 de janeiro. Então, vai ser rápido. Eu recomendo: quem estiver precisando do serviço da Defensoria pode agendar que eles são bem atenciosos e tudo acontece com bastante agilidade”, complementou Paulo Sérgio.
Venezuelano radicado em Manaus há 10 anos, o auxiliar de refrigeração Yovanny Garcia, 30, buscou atendimento para alteração no valor da pensão alimentícia do filho. “Me mandaram um link de uma reportagem sobre o mutirão e aí eu agendei. Hoje, já dei entrada no processo. Achei muito rápido”, contou.
Pioneirismo
A campanha “Eu tenho pai”, criada pela DPE-AM em 2022, é pioneira. “A ideia é fazer o atendimento da população vulnerável na área de família, atrelado à possibilidade do exame de DNA custeado pela própria Defensoria”, explicou o DPG, Rafael Barbosa.
“Eu sou de uma época que a Defensoria não tinha recursos pra proporcionar isso para os assistidos. Então, éramos obrigados a demandar o exame de DNA pela via judicial para o Estado ser condenado a custear esses exames. Hoje, a Defensoria faz a compra dos kits e proporciona isso para os assistidos”, disse.
A iniciativa da DPE-AM inspirou a criação da campanha nacional “Meu Pai Tem Nome”, realizada anualmente pelo Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) e pelas Defensorias Públicas estaduais.
Interior
A campanha ‘Eu tenho pai’ deste ano iniciou no último dia 19, com mutirões em municípios do interior do Amazonas. A mobilização encerra na próxima sexta-feira (29).
Texto: Luciano Falbo
Fotos: Márcio Silva/DPE-AM