O advogado da Federação Kokama do Alto Solimões, Serafim Taveira denuncia a falta de estruturas hospitalares para receber os pacientes e apela ao maior empenho do poder público para conter a propagação do vírus na região
Edney Kokama, Patriarca Tradicional
O avanço da contaminação pelo coronavírus nos povos indígenas dos municípios do Alto Rio Negro e Alto Solimões no Amazonas preocupa as lideranças das aldeias e motiva a denúncia de descaso com esses povos isolados ou não.
As cidades de Tabatinga, Benjamin Constant e Santo Antônio do Iça apresentam elevados níveis de contágio entre as etnias. “Nós, povo Kokama, habitantes originários deste extenso território do Alto e Médio Solimões, denunciamos o descaso do poder público frente o combate do COVID-19 nesta região”, foi a mensagem que o advogado da Federação Kokama do Alto Solimões, Serafim José Taveira Júnior, passou para www.agroflorestamazonia.com.
Taveira, que até o dia 30 de abril foi o Superintendente Regional do Amazonas, da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), agora representa os Kokama. Ele informou que “os indígenas estão sofrendo com a falta de atendimento, despreparo das equipes médicas e falta de estruturas hospitalares, Unidade de Pronto Atendimento – UPA e Unidade de Terapia Intensiva – UTIs, para receber os pacientes”.
Disse que e prefeito de Tabatinga, Saul Bemerguy, comunicou que a situação está fora de controle. “O povo Kokama está registrando óbitos todos os dias. Estão aflitos e indignados devido a negligência, descaso e omissão do poder público a nível Federal, Estadual e Municipal, apesar deste último, estar fazendo o possível para conter a propagação do vírus”, disse o advogado.
Por ser una região de fronteira com Peru e Colômbia de grande mobilidade terrestre e fluvial, as ações das autoridades se tornam insuficientes. O sistema de saúde público encontra-se sobrecarregado e sem os equipamentos necessários para responder a demanda de casos confirmados por este vírus.
Taveira denuncio que o Estado, através da SESAI, insiste em fazer diferença entre o atendimento de ‘parentes’ que vivem na cidade e os que estão na aldeia. Soma-se ao descaso das unidades de saúde, o desconhecimento no trato com os povos indígenas, negando sua identidade. De fato, o Hospital Militar HGUT de Tabatinga tem insistido em registrar na Declaração de Óbito como “pardo”, acrescentou o prefeito de Tabatinga e o DSEI do Alto Solimões.
AS CIFRAS
Segundo o último boletim da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas, sobre a situação epidemiológica de Convid-19 em população indígena, tem 123 casos confirmados, 9 óbitos e 7 suspeitos.
Parlamentares
O deputado Sinésio Campos (PT) sugeriu a instalação de hospitais de campanha nos municípios do Alto Rio Negro e Alto Solimões na região com o apoio dos militares.
Sinésio disse que as populações indígenas são muito vulneráveis ao vírus de gripes comuns e podem ser ainda mais com a Covid-19, que está contagiando e matando os indígenas locais.
A mesma pauta foi defendida pelo colega de partido, o deputado federal José Ricardo (PT), durante reunião da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, em que cobrou políticas de enfrentamento à Covid-19 nas aldeias do Amazonas
Entre as medidas sugeridas pelos parlamentares estão a instalação imediata de alas exclusivas para atendimento dos indígenas, contratação de médicos estrangeiros e medidas para acabar com as aglomerações nas agências da Caixa Econômica Federal (CEF); como também a cobrança de uma estratégia eficiente para a distribuição de cestas básicas aos povos aldeados e não aldeados.
Recomendações da Procuradora
O Procuradora da República, Aline Morais Martinez dos Santos, resolve, com fundamento no art. 5º e art. 6º, da Lei Complementar, recomendar :
a) Aos municípios da região do Alto Solimões (Tabatinga, Benjamin Constant, Amaturá, Santo Antônio do Içá, São Paulo de Olivença e Tonantins); região do Médio Solimões (Jutaí) e Vale do Javari (Atalaia do Norte):
a.1) abstenham-se, sob qualquer hipótese, de negar atendimento aos indígenas – aldeados ou não – que demandem cuidados de atenção básica ou média e alta complexidade, em razão de suspeita ou confirmação de contágio pela Covid-19, estejam eles referenciados ou não pelo Subsistema de Atenção à Saúde Indígena;
a.2) atendam, com prioridade, e de forma diferenciada os pacientes indígenas – aldeados ou não -, suspeitos da Covid- 19, de modo a diminuir o tempo de contato dos profissionais de saúde com os indígenas presentes no local de atendimento;
a.3) providenciem a adequada comunicação com o paciente indígena, disponibilizando o uso de intérprete com apoio da Funai, caso seja necessário para realizar a correta orientação, atendimento e tratamento;
a.4) registrem a identidade indígena e pertencimento étnico nos prontuários
médicos, relatórios, certidões (inclusive de óbito), aos pacientes que apresentarem documento que os considere indígenas, ou na ausência destes, pela exclusiva autodeclaração e consciência da identidade do indígena;
a.5) reúnam-se com a respectiva Coordenação Regional da FUNAI e com o respectivo Distrito Sanitário Especial Indígena, que possuem competência no respectivo município, e, articulem políticas públicas, a fim de garantir a inclusão dos povos indígenas nos planos emergenciais dos respectivos municípios;
- b) aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas do Alto Solimões (DSEI/ARS), do Médio Solimões (DSEI/Médio Solimões e Afluentes) e do Vale do Javari ( DSEI/Vale do Javari):
b.1) priorizem toda e qualquer iniciativa para que se estabeleça o que dispõe esta Recomendação; sem prejuízo, de nenhum item mencionado acima, que seja de competência na área de atuação do respectivo DSEI ;
b.2) abstenham-se, sob qualquer hipótese, de negar atendimento aos indígenas que demandem cuidados de atenção básica, em razão de suspeita ou confirmação de contágio pela Covid-19, estejam eles referenciados ou não pelo Subsistema de Atenção à Saúde Indígena;
b.3) promovam, interruptamente, articulação com as Secretarias de Saúde do município de sua atuação; bem como junto à Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas, a fim de garantir a inclusão dos povos indígenas nos planos emergenciais do estado e dos municípios;
No documento, fixa-se o prazo excepcional de três dias para o cumprimento da presente Recomendação, bem como seja informado ao Ministério Público Federal (MPF) seu devido cumprimento, e o envio das informações requeridas em ofício(s) à PRM/Tabatinga.
” A presente Recomendação dá ciência e constitui em mora os destinatários quanto às providências solicitadas, de modo que a omissão na adoção das medidas recomendadas implicará no manejo de todas as medidas administrativas e ações judiciais cabíveis contra os agentes que se omitirem em Tabatinga (AM)”, destaca a Procuradora.
Emprego das Forças Armadas
No Diário Oficial da União foi publicado em: 07/05/2020 | Edição: 86 | Seção: 1 | Página: 7, o DECRETO Nº 10.341 que Autoriza o emprego das Forças Armadas na Garantia da Lei e da Ordem e em ações subsidiárias na faixa de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas federais nos Estados da Amazônia Legal.
Texto: Dulce Maria Rodriguez
Fotos: Archivo
Vídeo: Edney Kokama