A agricultura familiar, um modelo de produção agrícola onde a gestão e o trabalho são predominantemente realizados por membros da própria família, tem se consolidado como pilar fundamental para o abastecimento de alimentos no Brasil. Com pequenas propriedades de terra e práticas que buscam a sustentabilidade, esse modelo de produção contribui para a subsistência das famílias e o fortalecimento das economias locais.
A agricultura familiar é marcada por algumas características principais: a gestão familiar, que envolve a tomada de decisões sobre o que plantar, como produzir e como comercializar os produtos; a pequena escala de produção, com cultivo diversificado e integração de várias atividades agrícolas; e a forte conexão com o território, onde os agricultores mantêm um vínculo direto com a terra e a comunidade.
A agricultura familiar é responsável por cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil, conforme dados do Censo Agropecuário, e tem um papel crucial para a segurança alimentar. Ao fornecer uma grande parte da produção de frutas, verduras, grãos e carnes, essa forma de agricultura contribui para a diversificação da dieta da população e para a redução da fome. Além disso, garante empregos no campo, ajudando a reduzir o êxodo rural e preservando práticas agrícolas tradicionais que sustentam as comunidades locais.
No entanto, os agricultores familiares enfrentam desafios, especialmente no que diz respeito ao acesso a crédito e tecnologias adequadas para aumentar a produtividade. A burocracia e a falta de garantias para obter crédito são obstáculos comuns, mas em regiões como o Amazonas, outros fatores como a complexidade logística, a falta de infraestrutura e a ausência de regularização fundiária agravam ainda mais a situação.
O cooperativismo tem se mostrado uma ferramenta eficiente para fortalecer a agricultura familiar. No Amazonas, como explica Cláudia, superintendente da OCB-AM (Organização das Cooperativas do Amazonas), as cooperativas seguem um modelo de empreendedorismo coletivo, no qual os cooperados unem esforços para alcançar objetivos comuns. “O cooperativismo no Amazonas se destaca pela sua resiliência e longevidade, com muitas cooperativas já estabelecendo mais de 20 anos de atuação”, afirma Cláudia. Ela também ressalta a importância do cooperativismo para a geração de empregos: “No Brasil, o cooperativismo gera mais de 560 mil empregos diretos, com um impacto significativo, principalmente em áreas rurais.”
As cooperativas proporcionam acesso a mercados, crédito e tecnologias, além de impulsionarem a economia local. Entre as cooperativas que se destacam no Amazonas, está a Coopaquam, que apoia piscicultores e compra ração para beneficiar a produção de pescados. Já a Agrofrut se dedica à produção de guaraná em pó orgânico, exportado para a Europa, e a Cooperar lidera a produção de amêndoas de cacau nativo, também com destino à exportação.
Apesar dos avanços, os agricultores familiares da região Norte, especialmente do Amazonas, enfrentam dificuldades adicionais. A líder comunitária Jocimara Bosco Brandão, natural de Pari-Cachoeira, uma comunidade indígena Tukano localizada na calha do Rio Tiquié, compartilha a realidade enfrentada por sua família e sua comunidade. “Moramos muito longe de São Gabriel da Cachoeira, e o transporte dos nossos produtos é uma grande dificuldade. Só quem mora na nossa região sabe o quanto enfrentamos para levar nossas mercadorias até o mercado. Às vezes, meus parentes viajam de rabetinha durante uma semana para chegar à cidade”, relata Jocimara.
Essa distância e os custos elevados de transporte impactam diretamente a capacidade de expandir os mercados para os produtos da agricultura familiar. Para Jocimara, o sonho de sua comunidade é criar uma cooperativa local que possa garantir um melhor escoamento dos produtos e maior autonomia para os agricultores. “Nosso sonho é esse, criar uma cooperativa para nossa aldeia e alcançar mercados maiores. Mas sem infraestrutura e apoio, fica difícil”, diz ela.
Com a crescente valorização da agricultura sustentável e a demanda por produtos orgânicos, o futuro da agricultura familiar no Brasil parece promissor. Jocimara acredita que a cada dia a agricultura familiar está sendo mais valorizada, o que é um sinal positivo para o futuro. “A esperança é que o cooperativismo ajude mais comunidades como a nossa a se desenvolverem”, conclui.
Para muitos agricultores no Brasil, o cooperativismo é uma oportunidade de aumentar a competitividade, acessar novos mercados e, principalmente, garantir a preservação das práticas agrícolas tradicionais. As políticas públicas, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), têm sido fundamentais para apoiar esse setor, oferecendo crédito acessível e assistência técnica, embora desafios como a regularização fundiária ainda precisem ser enfrentados.
O PRONAF, por exemplo, tem sido uma importante ferramenta de apoio ao agricultor familiar, oferecendo linhas de crédito com juros baixos e programas de capacitação técnica. No entanto, como ressalta Cláudia, ainda há muitos desafios a superar, principalmente no Amazonas, onde a logística e a infraestrutura são questões críticas. “Com mais internet rural, incentivos fiscais regionais e o apoio para a regularização fundiária, podemos melhorar a produtividade e a inclusão tecnológica da agricultura familiar”, explica Cláudia.
A agricultura familiar não só representa uma forma de vida para milhões de brasileiros, mas também uma estratégia fundamental para o desenvolvimento rural sustentável e para a segurança alimentar do país. Com o apoio das cooperativas, políticas públicas eficazes e a participação ativa das comunidades, a agricultura familiar tem o potencial de continuar sendo uma força vital para o Brasil.
Texto: Sandrine Moraes, Emelin López, Ryan Jatahy e Beatriz Costa
Fotos: Reprodução/Internet