Comunidade Caramuri, em Manaus, produz abacaxi em larga escala e estima safra de 900 mil frutas em 2020
A comunidade São Francisco de Caramuri tem se destacado na produção de abacaxi em larga escala no Amazonas. O plantio da fruta iniciou há 27 anos na comunidade e, atualmente, além de abastecer a mesa dos agricultores, a produção de abacaxi é responsável por grande parte da receita local.
Caramuri fornece, desde 2014, cerca de 300 mil quilos (kg) de abacaxi anualmente para o Programa de Regionalização da Merenda Escolar (Preme), da Agência de Desenvolvimento Sustentável do Estado (ADS). O abacaxi é vendido in natura, e segundo os agricultores, o quilo é comercializado a R$ 2,60, o que resulta em cerca de R$ 780 mil na economia da comunidade.
O seu Manuel Leandro da Silva, que é um dos pioneiros no cultivo de abacaxi em Caramuri, conta que até dezembro de 2020 prevê a colheita de 900 mil pés de abacaxi. O agricultor afirma que, em toda comunidade,15 hectares são destinados para a produção da fruta.
“Hoje plantamos cerca de 35 mil pés de abacaxi por hectare. Temos uma parceria com o Preme, por isso iniciamos o nosso plantio de janeiro ao mês de julho, e começamos a induzir o amadurecimento do fruto, com carboreto de cálcio, em fevereiro do ano seguinte. Esse processo dura até o mês de junho, quando destinamos a fruta para o governo”, explica o agricultor.
O produtor afirma que iniciou o cultivo de abacaxi em 1993, junto com o pai dele, Francisco Holanda. Hoje desenvolve a atividade com o irmão, Fábio da Silva. Manuel conta que o início da produção foi desafiador devido à falta de mecanização e dificuldades de logística. Para chegar em Caramuri por via terrestre, é necessário percorrer 134 km na rodovia AM-010 e mais 30 km de ramal. Os comunitários utilizam pequenos barcos ou rabetas para trafegarem pela comunidade, que é cercada por rios.
O agricultor salienta que até 2018 o escoamento da fruta era realizado de forma manual, com a utilização de paneiros. Mas as coisas começaram a mudar quando, no dia 15 de junho de 2019, o Governo do Estado entregou 17 triciclos com carretas adaptadas para a Associação Comunitária Agrícola São Francisco do Caramuri (ACASFC), um investimento de R$ 197,2 mil para auxiliar os produtores no escoamento dos abacaxis. Para Manuel, os tratores melhoraram as condições de trabalho em Caramuri.
“Por conta da chegada dos recursos do Fundo de Promoção Social (FPS), em 2019 iniciamos um trabalho com as áreas mecanizadas. Hoje o nosso plantio é moderno, com a utilização de tratores. Os triciclos vieram para mudar as condições de trabalho dos produtores de Caramuri, pois antigamente os abacaxis eram levados em paneiros, nas costas, tudo era difícil”, afirma o produtor.
Assim como em todo o território amazônico, o abacaxi produzido na comunidade, chama a atenção dos consumidores pelo forte sabor adocicado. De acordo com o pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Marcos Garcia, a variedade da fruta é denominada “Turiaçu”.
Marcos Garcia explica que o abacaxi variedade “Pérola”, embora seja o tipo mais cultivado no Brasil, não é cultivado no Amazonas. “Esta variedade (Turiaçu) é a de mais baixa acidez entre as cultivadas no Brasil. É também plantada na região de Turiaçu, município no estado do Maranhão, onde também é citada como o abacaxi mais doce que se conhece”, diz o pesquisador.
Defensivos agrícolas
Para a preparação do solo, Manuel da Silva explica que os agricultores de Caramuri utilizam, por hectare, duas toneladas de calcário, oito sacos de fósforo, além de quatro sacos de adubo FTE BR12. Com relação aos agroquímicos, os produtores fazem a borrifação após plantio de 20 gramas de inseticida Evidence, dissolvidos em 20 litros de água, além de 10 mililitros de DX e 5 mililitros de óleo mineral.
“Nós damos, no máximo, quatro borrifadas de agrotóxico na colheita da safra. Temos muito cuidado, porque o mesmo produto que vai para o Preme, também é servido na mesa para os nossos filhos”, conclui o agricultor.
A família de Elisângela Alves também se dedica ao cultivo de abacaxi. Junto ao esposo, Messias Alves, e aos três filhos, a agricultora realiza a produção em larga escala desde 2010 na Vila do Engenho, uma comunidade pertencente ao município de Itacoatiara, distante 2 horas de barco de Caramuri. Elisângela, porém, conta que o esposo integra como um dos 47 associados da ACASFC.
A agricultora conta que, além de vender para o Preme, busca desenvolver biscoitos e licores com o abacaxi. Elisângela disse que já conseguiu realizar vendas para o Estado de Roraima (RR), mas aguarda pelo registro de Indicação Geográfica (IG), que é um selo concedido pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).
A produtora afirma que a licença vai facilitar a exportação do abacaxi para outros Estados brasileiros. Com o IG são conferidos produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, valor intrínseco e identidade própria, além de distinguir os similares do produto disponíveis no mercado. “A partir do momento em que você chegar no mercado e olhar o abacaxi com o selo e olhar os outros, sem o selo, tenho certeza que vai optar pelo que tem o IG”, afirma.
Djaneide Lisboa, técnica agrícola do Instituto de Desenvolvimento Agropecuário do Estado do Amazonas (Idam), disse que acompanha a comunidade de Caramuri para orientação dos projetos prioritários do Instituto, envolvendo a produção de abacaxi e a bovinocultura. “Desde 2014 a gente tem trabalhado para providenciar o selo do IG, à produção de abacaxi, para que os agricultores possam exportar. Nesse selo, haverá especificações na embalagem, como o tempo de prateleira”, explica a técnica.
Djaneide Lisboa acrescentou que o Idam tem acompanhado o desenvolvimento de Caramuri, e realiza o trabalho de análise junto aos agricultores que têm potencial para integrarem os projetos prioritários. O acompanhamento envolve o preenchimento de um formulário de verificação de documentações, e de licenciamento ambiental.
“Os agricultores devem estar dentro dos padrões para que a gente possa inseri-los nas políticas públicas. Se eles não tiverem com todo o aparato de documentação do imóvel, dentro da questão ambiental, eles não têm acesso ao crédito rural”, explica Djaneide
Logística e infraestrutura
O presidente da ACASFC, Daniel da Silva, afirma que a infraestrutura do ramal ainda é o principal desafio para a exportação da fruta. O presidente salienta que as estradas que dão acesso à rodovia AM-010 não são pavimentadas e, em períodos chuvosos, impossibilitam o transporte de veículos de grande porte. Daniel também conta que a comunidade ainda não possui uma estrutura de agroindústria e a produção de derivados da fruta ainda é limitado.
“Quando a comunidade iniciou, já conseguimos produzir 2 milhões de frutos. Devido às grandes dificuldades, a produção foi diminuindo e quase acabou. A partir do momento que a gente começa a acessar as políticas públicas, voltadas para o setor primário, houve o resgate da produção”, explica o presidente.
Daniel acrescenta que os recursos oriundos da produção do abacaxi são destinados para a manutenção e compra de equipamentos e na infraestrutura de Caramuri. O presidente da Associação ressaltou que incentiva as novas gerações a darem continuidade ao trabalho desenvolvido ao longo das últimas décadas.
“Com os recursos da produção, já construímos a garagem dos nossos implementos, áreas de serviços, como a cozinha e banheiros comunitários, toda a estrutura de abastecimento de água, motor de luz. Nós reformarmos a escadaria, e o Centro Social de Caramuri e iniciamos a construção da Unidade Básica de Saúde (UBS) e temos um projeto muito grande de construção da quadra e do centro sociocultural”, conclui Daniel da Silva.
Texto: Izaías Godinho / Fotos: Divulgação/Adaf