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O dia a dia dos ribeirinhos produtores rurais de Tefé

Dona Aninha e Seu Zequinha no preparo das cebolinhas um dia antes de ir para venda no mercado (Foto: Anderson Oliveira)

Umas das maiores características dos rios amazônicos são os ribeirinhos. Um povo que mesmo em meio às limitações imposto pela subida e vazante do rio, não perde a alegria de estar em harmonia com a Natureza.

No município de Tefé, conheci a comunidade Santa Clara, distante trinta minutos de catraia da sede. No local, habitado por aproximadamente 130 pessoas, na Ilha do Tarará, os ribeirinhos sobrevivem da agricultura familiar, principalmente da comercialização de hortaliças como: cheiro verde, cebolinhas de “palha”, pimenta de cheiro.

Exemplo de agricultura familiar é o líder comunitário local, José Barbosa da Silva, o Zequinha, filho do fundador da comunidade, que vive a mais de quarenta anos no local, juntamente com sua esposa Ana Maria, a Dona Aninha, que sobrevivem, exclusivamente, da plantação. Entrevistei ambos em sua residência, um local aconchegante, que chama atenção pela fachada das casas, palafitas pintadas de muito colorido e com adornos de madeira fazendo desenhos.

Colorido das casas da comunidade Santa Clara chama atenção dos barcos que circulam na região (Foto: Milena di Castro)

Agrofloresta –  Como é o dia a dia na plantação?

Zequinha – Para ir até a plantação, devido à subida do rio, temos que ir de canoa e por volta das 07h já estamos no terreno limpando e plantando, por volta das 11h já estamos retornando para a casa. No dia de “preparo”, colhemos tudo e levamos para casa para fazer a “amarração” e para o dia seguinte ir até a sede para vender.

Seu Zequinha em meio a plantação (Foto: Anderson Oliveira)

Agrofloresta – No dia de venda no mercado, a que horas tem que ficar tudo pronto?

Zequinha – Eu acordo às 03h da madrugada, coloco o motor da canoa, no máximo às 04h tenho que sair daqui para pegar um melhor local para vender para que não percamos tempo lá (em Tefé). Nós estamos em cheia então temos que ter o máximo de cuidado e voltar logo para retirar e não ter  a perda do produto com a elevação dos rios.

Chegada na madrugada no Mercado Municipal (Foto: Mário Linhares)

Nossa equipe acompanhou o dia a dia deles, desde a retirada das hortaliças no meio da plantação, a preparação destas para levar à cidade e no meio da madrugada, por volta das 04h da manhã,  a saída da comunidade até a chegada no município de Tefé organizando o “tabuleiro”, como eles chamam o local de vendas, no Mercado Municipal para a venda. No meio do banzeiro do rio, o caboclo utiliza uma pequena lanterna comum, amarrada em seu chapéu e o conhecimento de quem nasceu na região como seu localizador e saber qual o caminho correto usar.

Chegada do Seu Zequinha no Mercado Municipa Eduardo Sá, em Tefé (Foto: Anderson Oliveira)

Agrofloresta – Como é trabalhar como agricultora D. Aninha e quais as dificuldades que vocês têm hoje aqui?

Aninha – Eu amo minha profissão, é muito bom ver a terra nos ajudar com o alimento, hoje vai uma média de 270 pacotes para o mercado, para venda.  A nossa maior dificuldade aqui é que órgãos como IDAM não vêm até aqui na comunidade para nos ajudar, sabemos que eles ajudam, mas não sabemos como, não temos informações de como podemos receber esse apoio para aumentar nossas plantações e qual a melhor forma para não perdermos a nossa produção. A única coisa que queremos é mais atenção dos órgãos.

Agrofloresta – O que afetou vocês com a pandemia?

Zequinha – Foi mandado para gente aqui na comunidade um decreto na prefeitura, onde pedia para que todos das comunidades usassem máscara, aqui na comunidade é difícil agente usar máscara, mas quem vai para a cidade vai de máscara, de álcool gel. Diminuíram as vendas, muita gente adoecendo, as pessoas têm medo de ir até o mercado.

Agrofloresta – Alguma instituição ajuda vocês, seja organização governamental brasileira ou estrangeira?

Zequinha – Nunca recebemos ajuda nenhuma de ninguém, principalmente agora com essa doença. Estamos aqui pela proteção divina, se alaga não tem ajuda, se seca não tem ajuda é nós e é nós mesmo, ajuda só de Deus é Ele que nós dá força para trabalhar e manter a família.

Momento mais esperado do dia - a venda (Foto: Anderson Oliveira)

Na comunidade, cada dia da semana é uma família que leva seu produto para o Mercado Municipal de Tefé, Eduardo Sá. Devido o preparo ser extremamente artesanal, não há como irem todos os dias e o retorno financeiro é pouco.

A sede do município decretou Lockdown, no dia 05 de maio, as atividades só poderiam começar das 06h às 17h, mas na prática, nossa equipe de reportagem não percebeu isso pelo período da manhã, pois os produtores e comerciantes iniciam as suas atividades ainda no escuro, devido o medo e na pretensão de vender o mais rápido e voltarem às comunidades, o que mais mudou no cotidiano é uso de máscaras pela população, mas ainda é comum ver moradores sem a utilização destas, tanto nas ruas e quanto no mercado, mesmo com avisos em diversos pontos da cidade. Ao questionar o motivo que não estão utilizando o principal equipamento de proteção a resposta que recebi foi à mesma – eu já tive a doença, não pego mais.

Texto: Milena di Castro

Foto de capa: Anderson Oliveira

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