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Mercado de carbono: veja por que acordo inédito na COP29 abre caminho para comércio de créditos entre países

Mecanismo, que será implementado e supervisionado pela ONU, deverá estimular investimentos de US$ 250 bi em países em desenvolvimento. Sem a presença dos maiores países poluidores, conferência é aberta com alerta

 

Representantes dos países reunidos no primeiro dia da 29ª Conferência do Clima da ONU (COP29), em Baku, no Azerbaijão, chegaram a um acordo inédito para criação de um mercado de carbono global. O mecanismo tem como objetivo permitir que países invistam em redução de CO2 no exterior em troca de créditos/direitos de emissão.

 

A ideia é, por exemplo, um país rico bancar projeto de redução de emissão de gases de efeito estufa numa nação em desenvolvimento e, em contrapartida, receber licença para emitir carbono em um certo limite além de sua meta.

 

O texto aprovado ontem, a primeira decisão da COP29, não cria logo de cara a estrutura para o mercado de carbono funcionar, mas reconhece a autoridade de um “corpo supervisor” de técnicos criado pela Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) para implementar o sistema.

 

Esse órgão da ONU vai “elaborar padrões” e “supervisionar o mecanismo” que criará as regras para trocas de créditos de carbono.

 

— Essa será uma ferramenta para virar o jogo e direcionar recursos para o mundo em desenvolvimento. Após anos de impasse, os avanços em Baku agora começaram. Mas há muito mais a ser entregue — afirmou o presidente da COP29, Mukhtar Babayev, ministro azerbaijano do Meio Ambiente.

 

A conferência no Azerbaijão não terá a presença dos líderes das duas nações que mais emitem CO2: Joe Biden, dos EUA, e Xi Jinping, da China. Além deles, Lula e os chefes de Estado da França, Emmanuel Macron; da Alemanha, Olaf Schol; e do Reino Unido; Keir Starmer, não vão ao encontro.

 

— Estamos a caminho da ruína. E não se trata de problemas futuros. A mudança climática já está aqui. Precisamos muito mais de todos vocês. A COP29 é um momento da verdade para o Acordo de Paris — alertou o presidente da conferência na abertura do evento.

 

Segundo Babayev, a expectativa é que um mercado de carbono endossado pela ONU seja capaz de reduzir os custos de implementação dos planos climáticos nacionais em US$ 250 bilhões por ano, ao permitir a cooperação entre nações.

 

O objetivo dos textos aprovados ontem é garantir que as regras obedeçam a princípios sacramentados pelo Acordo de Paris. Os técnicos buscam assegurar que tal mercado não permita a países recuarem de seus objetivos de corte de CO2 e garantir a transparência para que projetos de cortes de emissão possam ser avaliados.

 

Projetos de cortes de emissão podem ser, por exemplo, programas de substituição de usinas a carvão — para países pobres carentes de investimento — em energia renovável ou sistemas de reflorestamento para que árvores em crescimento capturem CO2. Uma preocupação é impedir que minúcias das regras abram subterfúgios para “vazamentos” nas contas de carbono evitado.

 

A ideia é que só possam gerar créditos projetos capazes de comprovar uma “adicionalidade” nos cortes de emissões.

 

Em programas para redução de emissões por desmatamento e degradação de florestas, por exemplo, esses vazamentos podem ocorrer se o desmate de uma área protegida é deslocado para outra área, para criação de pastagem ou lavoura.

 

O texto também inclui, de maneira ainda vaga, o compromisso de assegurar que comunidades locais sejam consultadas para a implementação de projetos que as afetem. Essa demanda, um ponto de atrito nas discussões entre países, foi objeto de críticas de ONGs ambientalistas durante os processos de discussão.

 

Algumas ONGs também criticaram a “pressa” e o que chamam de falta de “transparência do acordo”, aprovado logo no primeiro dia da COP29.

 

— Dar início à COP29 com um “acordo secreto” é um precedente ruim para transparência e governança adequada — disse Isa Mulder, da Carbon Market Watch.

 

Crítica ao acordo

Alguns ambientalistas dizem que o esforço dispendido na discussão de mercados de carbono é um desvio da função primordial da convenção do clima, que é garantir o cumprimento de metas do Acordo de Paris e de emissões de CO2.

 

— É um sinal muito ruim abrir essa COP com a adoção de um artigo que legitima os mercados de carbono como uma solução para as mudanças climáticas. Eles não são uma solução. Os mercados de carbono aumentarão as desigualdades, infringirão os direitos humanos e impedirão a ação climática de fato — diz Ilan Zugman, diretor da ONG 350.org para América Latina e Caribe.

 

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